Coordenadora da Central de Transplantes, Daniela Ramos, ressalta que campanhas contribuíram para aumentar índice de pessoas que aceitam doar os órgãos (Fotos: Carla Cleto) |
Texto de Marcel Vital e Josenildo Törres
Alagoas vem registrando queda na taxa de recusa familiar para
doação de órgãos para transplantes. De acordo com a Associação
Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO), o índice de negativas caiu
de 71% em 2016, para 44% em 2017. Isso significa que, em um ano, o
número de famílias que autorizaram a doação de órgãos de parentes com
morte encefálica subiu 27%, o que leva o Estado a acompanhar o cenário
nacional, cujo percentual corresponde a 42%.
“Atribuímos esses bons números ao trabalho de nossa equipe e,
principalmente, às campanhas de conscientização que temos feito, que nos
permitiram alcançar um público de diversas faixas-etárias.
A Central de Transplantes de Alagoas e a Organização de Procura de
Órgãos (OPO) vêm trabalhando incansavelmente, tanto para garantir a
integridade de todo o processo, quanto a agilidade para que os órgãos
cheguem aos receptores”, destacou Daniela Ramos, coordenadora da Central
de Transplantes de Alagoas.
Contudo, 493 pessoas ainda estão na fila de espera por um órgão em
Alagoas. Destas, 318 esperam para receber um rim, 173 para receber uma
córnea e duas aguardam por um coração.
Portanto, para que a doação ocorra, é indispensável a autorização dos
familiares. Por isso, um meio para ampliar a doação no Estado, de
acordo com Daniela Ramos, seria que as pessoas que já tenham a
consciência da importância da doação de órgãos declarassem aos seus
familiares e amigos que desejam ser doadores.
“O cidadão que deseja ser doador não precisa assinar nem pagar nada,
basta comunicar sua família para que, caso necessário, o procedimento
seja autorizado. Para doações em vida, o doador deve ter mais de 18 anos
de idade e o receptor deve ser cônjuge ou parente consanguíneo”,
explicou.
Apesar de difícil, esse tipo de conversa familiar não deveria ser
adiado para situações de emergência, pois, num momento de grande comoção
a família pode ficar em dúvida sobre o que fazer, caso não existam
consensos prévios.
“O desconhecimento da vontade do doador, a questão religiosa e,
muitas vezes, o conflito entre os familiares, visto que uns aceitam,
enquanto outros não, são alguns dos obstáculos que impossibilitam a
realização dos transplantes de órgãos”, afirmou.
Apesar da ênfase emocional das campanhas públicas de incentivo à
doação, é preciso que as pessoas saibam como ocorre todo o processo. A
doação de órgãos ocorre quando há morte encefálica, que segue um rígido
protocolo de exames clínicos e laboratoriais, em que a equipe médica
especializada constata que a situação é irreversível.
Um único doador em morte encefálica pode, ao mesmo tempo, ajudar
várias pessoas. Isso porque, todos os órgãos e tecidos autorizados pela
família serão destinados a vários receptores, inscritos em filas de
espera.
Quem arca com os custos dos procedimentos relacionados aos
transplantes é o Sistema Único de Saúde (SUS), que também se
responsabiliza pelo fornecimento, durante toda a vida, das medicações
necessárias para evitar a rejeição do órgão transplantado. Nem a família
do doador e nem a do receptor devem pagar para que os procedimentos
sejam realizados.
Os órgãos e tecidos doados são removidos por meio de uma cirurgia.
Portanto, a doação não desfigura o corpo, que pode ser velado
normalmente, podendo, inclusive, ser cremado. A coordenadora da Central
de Transplantes de Alagoas acrescentou que, para o sucesso do
transplante, é necessário o uso dos imunossupressores, que irão adequar o
sistema imunológico e evitar a rejeição do órgão.
Além disso, é preciso cuidar das consultas, exames médicos periódicos
e alimentação rica em cores variadas, que contenham proteínas,
vitaminas e minerais, ingeridos de forma equilibrada, seguindo os
horários, as orientações e cuidados.
“A doação de órgãos é um ato de caridade e amor ao próximo. A cada
ano, muitas vidas são salvas por esse gesto altruísta. A conscientização
da população sobre a importância da doação de órgãos é vital para
melhorar a realidade dos transplantes no Estado”, concluiu.
Solidariedade na Dor
A família do vigilante Marcos Paciência Torres está entre as que
contribuíram para aumentar o número de autorizações para doação de
órgãos em Alagoas. Isso, porque, mesmo em meio à dor de ver o ente
querido internado, após ser atropelado em Maceió, a esposa e as irmãs
autorizaram a doação dos órgãos, mediante a constatação da morte
encefálica.
“De repente ele estava conosco, bem, saudável. Em um piscar de olhos
fomos informados que ele se encontrava internado no HGE [Hospital Geral
do Estado]. Não é fácil perder o irmão mais novo. Mas, o mais difícil
mesmo, foi ter que decidir sobre doar seus órgãos, quando a gente só
pedia a Deus que nosso irmão se recuperasse e pudesse voltar ao nosso
convívio”, recorda , emocionada, a irmã de Marcos Paciência Torres.
No entanto, em meio da dor da perda, saber que os órgãos do irmão
fariam quatro pessoas terem mais qualidade de vida foi decisivo para que
a pedagoga, outra irmã do vigilante e sua esposa, autorizassem a
doação. “Deus derramou seu sangue por nós. Não poderíamos agir com
egoísmo e deixarmos de salvar outras pessoas, principalmente por
sabermos que nosso irmão só fazia o bem”, relatou a irmã do vigilante,
que teve os rins, fígado e córneas doados.
Para isso, no entanto, foram decisivas as explicações da enfermeira
da Organização de Procura de Órgãos (OPO), Mônica Ferrari. Profissional
experiente e com grande sensibilidade para esclarecer todas as dúvidas
que uma decisão desta magnitude requer, ela diz que os anos de atuação e
treinamento a fizeram conquistar destreza na hora de abordar os
familiares de pacientes com morte encefálica.
“É um momento de extrema dor, porque todos os familiares de uma
pessoa que está entre a vida e a morte cultivam o desejo de vê-la
recuperada e restabelecida. É muito complexo ter que acionar os
familiares para explicar que a pessoa amada passará por exames e, que
estes, podem constatar a morte encefálica. Mais complexo ainda é
explicar a quem está fragilizado que a morte do ente querido ocorreu e
que, neste momento, os familiares podem optar pela doação de órgãos, que
pode salvar a vida de outra pessoa”, explicou Mônica Ferrari.
Agência Alagoas
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